Credor da execução e devedor do crédito, o estado do Rio Grande do Sul só vai poder executar o que é dele por direito quando resolver pagar suas dívidas. A saída ao calote foi encontrada pela 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça gaúcho, que proveu recurso da América Móveis e Eletrodomésticos contra o estado.
Com a decisão, os desembargadores reconheceram como válida a penhora dos precatórios, “tirando totalmente a possibilidade do Poder Público não aceitar o crédito podre, que só está nessa condição por sua exclusiva responsabilidade”, diz o advogado Nelson Lacerda, do Lacerda & Lacerda Advogados.
O Superior Tribunal de Justiça, por meio de repercussão geral, já reconheceu como possível a recusa da Fazenda Pública quanto à penhora de crédito de precatório por violar a ordem legal. Mesmo assim, essa negativa não pode se dar de forma “pura e simples, sem demonstração nem justificativa”, diz o acórdão. É nesse sentido que a decisão do TJ gaúcho se alinha.
No caso, o estado do Rio Grande do Sul, na qualidade de exequente, declarou como ineficaz a nomeação de precatórios à penhora. Como lembrou o desembargador Jorge Maraschin dos Santos, relator, “o crédito representado por precatório é bem penhorável, mesmo que a entidade dele devedora não seja a própria exequente”.
O artigo 656 do Código de Processo Civil elenca as causas possíveis da recusa. Em nenhum momento é citada a impenhorabilidade do bem oferecido. O acórdão diz que o regime da penhora do precatório é o mesmo da penhora do crédito, ou seja, o credor ou será satisfeito pela subrogação — ou pagamento — no direito penhora ou pelo dinheiro resultante da alienação desse dinheiro a terceiro.
De acordo com o desembargador, “cabe ao credor o direito de recusar a nomeação de bens à penhora realizada pela parte executada”. Mais pra frente, Maraschin dos Santos escreve que “o Estado recusar a penhora de crédito precatório, em última análise, devido por ele mesmo, porque tem pouca liquidez, é querer tirar proveito da própria torpeza, visto ser o causador disso”.
O advogado Nelson Lacerda acredita que a decisão pode servir de norte para o Judiciário. Isso porque, aponta, o Estado “além de não pagar os precatórios, tenta se negar a recebê-los para compensação, pagamento ou garantia de dívidas, causando diversos movimentos processuais que deveriam ser considerados como litigância de má-fé”.