O ABANDONO DE CARGO DO SERVIDOR PÚBLICO ANTE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR SOB A ÓTICA DA LEI NO 8.112/1990

IGO BAIMA
Advogado
Professor de Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância na Universidade de Fortaleza

“Na totalidade dos casos em que não foi
configurada a intencionalidade do servidor, não
se pode haver demissão por falta do requisito
fundamental do animus abandonandi”

A estabilidade do servidor público foi instituída como um princípio fundamental constitucional da Administração Pública, visando proteção ao servidor que não pode ficar sujeito ao receio de exoneração ou demissão arbitrária, quando venham porventura a contrariar eventuais anseios privados de agentes públicos.

A extinção do vínculo institucional com o Estado somente pode se dar por prática de irregularidades e infrações as quais estão reguladas pela Lei no 8.112/1990. Especificamente no art. 132, II, está disposto: “Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos: (…) II – abandono de cargo”.

Para que seja apurado o abandono de cargo, o servidor público deve ser submetido a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), no qual irá se investigar todos os fatos que levaram o servidor público a se ausentar do serviço. O PAD deve obedecer todas as regras estabelecidas na Lei no 8.112/1990 e, no caso de não observância pela comissão investigativa (que pode ser permanente ou nomeada temporariamente), as nulidades processuais podem, dentre diversas consequências, gerar prescrição intercorrente no PAD, o que gera a impossibilidade de responsabilização do servidor investigado.

A configuração do abandono de cargo se deriva da intenção do servidor de se ausentar injustificadamente por mais de 30 dias consecutivos ao trabalho.

Rege o art. 138 da Lei 8.112/90: “Art.138 – Configura abandono de cargo a ausência intencional do servidor ao serviço por mais de trinta dias consecutivos”.

É importante salientar que pra que se configure o abandono de cargo se faz imprescindível que esteja presente o animus abandonadi, ou seja, que o servidor tenha a intenção de abandonar o cargo.

A exemplo tem-se servidor que foi diagnosticado com depressão, servidor que foi diagnosticado como alcoólatra, servidor que foi preso e servidores que foram demitidos por se ausentarem injustificadamente do trabalho por mais de 30 dias consecutivos.

Aos servidores que foram diagnosticados com doença elencada com CID específico, estes não podem ser demitidos, devem ser tratados. Para tanto se deve se anular a demissão e ser oportunizado tratamento

ao servidor, inclusive com deferimento de licença médica sem supressão de vencimentos.

Em caso do tratamento não ser eficaz ao ponto de restabelecer as condições mentais/físicas do servidor, a este deve ser concedida aposentadoria por invalidez.

No caso de servidor que venha a ser preso, deve-se comunicar sua prisão ao órgão empregador e anular, caso não tenha sido decretada judicialmente a demissão do servidor, a demissão via processo administrativo disciplinar. Acrescenta-se que a Justiça entendeu correto, enquanto afastada a voluntariedade de abandono do cargo pelo servidor em cumprimento de prisão preventiva, que fosse suspensa a remuneração do funcionário faltoso.

Incluem-se na contagem do prazo de faltas ao serviço os domingos e feriados intercalados entre os dias úteis em que o servidor não compareceu ao trabalho.

Em resumo, na totalidade dos casos em que não foi configurada a intencionalidade do servidor, não se pode haver demissão por falta do requisito fundamental do animus abandonandi.

Toda e qualquer penalidade administrativa deve ser antecedida por sindicância (a qual não pode apurar demissões) ou Processo Administrativo Disciplinar.

Revista Justiça e Cidadania

https://www.editorajc.com.br/edicao/278/