Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deferiu em parte a medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 234, ajuizada na Corte pela Associação Nacional do Transporte de Carga e Logística contra a Lei paulista 12.684/2007, que proíbe o uso e o transporte de amianto no estado.
Com a decisão, ficam suspensas as interdições ao transporte do produto, praticado pelas empresas associadas à autora da ação, quando fundadas no descumprimento da norma questionada. De acordo com o relator do caso, ministro Marco Aurélio, as empresas têm direito ao transporte interestadual e internacional das cargas, observadas as disposições legais editadas pela União.
Segundo a entidade de classe que representa as empresas de transporte de cargas, embora haja lei federal (Lei nº 9.550/95) que proíba, em todo o território nacional, a extração, produção, industrialização, utilização e comercialização das variedades minerais pertencentes ao grupo dos anfibólios (actinolita, amosita ou asbesto marrom, antofilita, crocidolita ou amianto azul e tremolita) e libere tais atividades em relação ao amianto branco (variedade crisotila), a lei paulista ampliou a proibição contida na lei federal (alcançando a crisotila) e está resultando na proibição do transporte da carga pelas rodovias do estado.
Isso porque, de acordo com a entidade, a lei estadual tem sido invocada por fiscais do trabalho, que entendem que a norma proibiria também o transporte pelas rodovias do estado do produto, ainda que a carga seja originária de outro ente federado, onde não existe proibição de seu uso e comercialização, e tenha como destino outro estado ou a exportação, pelo porto de Santos.
Procuradores do Trabalho
Durante o julgamento, ao atuar como amicus curiae (amigo da Corte), a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho se manifestou no sentido de que a lei paulista, que proíbe uso e comercialização do amianto é matéria relativa ao direito à saúde, ao direito ambiental, hipótese que revela competência legislativa concorrente. A União fixa um piso mínimo de proteção, mas nada impede que os estados e municípios estabeleçam proteção mais rigorosa, disse o advogado da entidade.
Trilha de sofrimento
Já o advogado da Associação Brasileira de Expostos ao Amianto disse entender que a lei estadual questionada por meio da ADPF não ofende a Constituição Federal. Antes a cumpre, a consagra, nos seus princípios mais avançados, no respeito à saúde, à dignidade da pessoa humana. Ele citou estudos que apontam que não existem limites seguros de contato com o amianto. Onde há amianto, há uma trilha de sofrimento, dor e morte a ele associado, disse o advogado, revelando que mais de 50 países já decretaram o banimento total do amianto, em todas as suas formas geológicas.
Relator
Em seu voto (leia a íntegra), o relator da matéria, ministro Marco Aurélio, disse entender que a discussão nessa ADPF não se confundia com outros debates havidos na Corte a respeito da proibição do uso e comercialização do amianto. Para ele, a ADPF trata da inviabilização do acesso a serviços públicos constitucionalmente atribuídos à União, como as rodovias e o porto de Santos.
Nesse sentido, o ministro disse entender que compete privativamente à União legislar sobre a matéria, uma vez que o bom senso recomenda que questões relacionadas ao interesse nacional sejam tratadas de maneira uniforme, para todo o país. Quando a matéria transcender interesses locais e regionais, a competência para legislar é da União, disse o ministro, lembrando que a Corte já declarou o entendimento de que portos são serviços públicos federais.
Ao votar pelo deferimento parcial da cautelar, o ministro disse entender que não se pode negar acesso às rodovias, que seriam usadas na comercialização do produto que se insere nas atividades licitamente exercidas por pessoas jurídicas.
Acompanharam o relator os ministros Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
Divergência
Os ministros Ayres Britto, Celso de Mello e Cezar Peluso divergiram do relator. Para eles, ao proibir o uso e comercialização do amianto, produto reconhecidamente tóxico no entender dos ministros, a norma estadual parece atender muito mais à Constituição Federal do que a lei Federal que trata do tema. Para o decano da Corte, não se deve invocar a Lei Federal 9095/95, porque a lei nacional seria menos fiel ao mandamento constitucional do que a lei estadual.
Celso de Mello disse entender, ainda, que o estado de São Paulo, no desempenho de sua autonomia político-jurídica, objetivando preservar a vida e a saúde de sua população e a integridade de seu patrimônio ambiental, editou a lei questionada de modo legítimo.