Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu nesta quinta-feira (28) o julgamento do Recurso Extraordinário (RE 601392) que discutia a imunidade da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) em relação ao recolhimento do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) nas atividades exercidas pela empresa que não tenham características de serviços postais. Após reformulação do voto do ministro Ricardo Lewandowski, somaram-se seis votos favoráveis para reconhecer que a imunidade tributária recíproca – nos termos do artigo 150, VI, “a”, da Constituição Federal (que veda a cobrança de impostos sobre patrimônio, renda ou serviços entre os entes federados) – alcança todas as atividades exercidas pelos Correios. O tema teve repercussão geral reconhecida.
No recurso, a empresa pública questionava decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que reconheceu o direito de a Prefeitura de Curitiba (PR) tributar os Correios com o ISS nos serviços elencados no item 95 da Lista anexa do Decreto-lei 56/1987. Esses serviços abrangem cobranças e recebimentos por conta de terceiros, inclusive direitos autorais, protestos de títulos, sustação de protestos, devolução de títulos pagos, manutenção de títulos vencidos, fornecimento de posição de cobrança ou recebimento e outros serviços correlatos da cobrança ou recebimento.
Conforme argumento dos Correios, a decisão do TRF-4 contrariou o artigo 21, inciso X, da Constituição Federal, segundo o qual compete à União manter o serviço postal e o correio aéreo nacional. Sustentou ainda que o STF deveria reconhecer a “imunidade completa” de suas atividades, pois todos os seus rendimentos estão condicionados à prestação de serviço público.
Julgamento
O julgamento foi retomado hoje com o voto-vista do ministro Dias Toffoli, que se posicionou pelo provimento do RE. De acordo com o ministro, “a imunidade deve alcançar todas as atividades desempenhadas pela ECT, inclusive as atividades afins autorizadas pelo Ministério das Comunicações, independentemente da sua natureza”. O ministro destacou que se trata de uma empresa pública prestadora de serviços públicos criada por lei para os fins do artigo 21, inciso X, da Constituição Federal e afirmou que todas as suas rendas ou lucratividade são revertidas para as “finalidades precípuas”.
No mesmo sentido já haviam votado – em novembro de 2011 – os ministros Ayres Britto (aposentado), Gilmar Mendes e Celso de Mello. Na ocasião, o ministro Ayres Britto foi quem abriu divergência, ao entender que “é obrigação do poder público manter esse tipo de atividade, por isso que o lucro, eventualmente obtido pela empresa, não se revela como um fim em si mesmo, é um meio para a continuidade, a ininterrupção dos serviços a ela afetados”.
Após o voto do ministro Dias Toffoli, a ministra Rosa Weber acompanhou o mesmo entendimento, assim como o ministro Ricardo Lewandowski, que mudou seu posicionamento e, dessa forma, formou a maioria pelo provimento do recurso.
Lewandowski afirmou ter ficado convencido, após analisar melhor a questão, de que os Correios prestam um serviço público de natureza essencial e atua onde a iniciativa privada não tem interesse de atuar e, portanto, não há concorrência com fins lucrativos. Ele lembrou que as próprias empresas privadas responsáveis pela entrega de encomendas e pacotes se valem do serviço dos Correios porque do ponto de vista financeiro é desinteressante.
“Não se pode equiparar os Correios a empresas comuns em termos de concorrência porque não concorre de forma igualitária com estas. Primeiro porque precisa contratar seus bens e serviços mediante a Lei 8.666/93, que engessa sobremaneira a administração pública”, afirmou o ministro ao destacar que “não há nenhuma disparidade de armas no que tange ao reconhecimento dessa imunidade fiscal relativamente aos Correios”.
Relator
Ficaram vencidos nessa questão o relator, ministro Joaquim Barbosa, e outros quatro integrantes da Corte que o acompanharam: os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Cezar Peluso (aposentado).
De acordo com o relator, no momento em que a empresa age com intuito de fins lucrativos, para si ou para outrem, a imunidade recíproca de tributos não deve ser aplicada. E este seria, segundo ele, o caso dos serviços questionados no RE. O ministro Joaquim Barbosa observou que o Estado e os “diversos braços estatais” só podem exercer essa atividade econômica excepcionalmente. “A regra é o exercício de atividade econômica por atores privados”. Em sua opinião, deveria haver uma distinção entre os serviços lucrativos e os serviços executados pelo Estado.
O relator ainda lembrou que a ECT exerce, ao mesmo tempo, atividade postal e bancária, como a venda de títulos em concorrência com o setor privado. De acordo com ele, a Constituição Federal determina que, quando o Estado ou empresa estatal resolve empreender na área econômica, deve fazê-lo em igualdade de condições com o particular. “Deve-se estabelecer a distinção: quando está diante de exercício de serviço público, há imunidade absoluta, quando se tratar de exercício de atividade privada, devem incidir as mesmas normas incidentes sobre as empresas privadas, inclusive as tributárias, como diz a Constituição”, afirmou.