Por Odasir Piacini Neto
Alguns decretos regulam a matéria de forma meramente exemplificativa, “sendo possível que outras atividades não enquadradas sejam consideradas perigosas”
Em recente decisão, publicada no dia 6/6/2014, o Tribunal Superior do Trabalho reafirmou o entendimento de que para o pagamento do adicional de insalubridade não basta à constatação da efetiva submissão ao agente insalubre por meio de laudo pericial, sendo necessária a classificação da atividade na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho Emprego, NR 15 da Portaria n° 3.214/78. Eis a ementa do referido julgado:
RECURSO DE REVISTA. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. SERVENTE DE OBRAS. CONTATO COM CIMENTO. Não obstante a constatação, por laudo pericial, da insalubridade das atividades exercidas pelo reclamante, servente de obras, pelo contato com o cimento, devido a sua utilização na construção civil, esta Corte Superior, por meio da SBDI-1, firmou entendimento, consubstanciado na Orientação Jurisprudencial nº 4, no sentido de que não basta a constatação da insalubridade por meio de laudo pericial para que o empregado tenha direito ao respectivo adicional, sendo necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. A posição deste Tribunal Superior é de que as atividades realizadas por pedreiros (servente de obras) não se encontram classificadas pela NR 15 da Portaria nº 3.214/78, de modo que o reclamante não faz jus ao adicional de insalubridade. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.
(RR – 447-32.2011.5.04.0271 , Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 4/6/2014, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 6/6/2014)
Com a devida vênia a Corte Superior, o entendimento em questão encontra-se equivocado, uma vez que ignora o preceito maior das normas Trabalhistas, que é a proteção do trabalhador1.
Considerar o rol de agentes previstos na NR 15 da Portaria n° 3.214/1978 como taxativo é ignorar a própria intento legis, que, no caso em questão, busca proteger o trabalhador submetido a condições prejudiciais à saúde, indenizando-o com o pagamento do adicional de insalubridade.
Ressalte-se que a norma que regulamenta a matéria é de 1978 (NR 15 da Portaria n° 3.214/1978), sendo certo que o legislador não acompanha a evolução dos agentes insalubres. Assim sendo, uma vez definido pela medicina o agente insalubre e constatado por meio de laudo pericial a efetiva submissão a ele, inequivocamente, o trabalhador deve fazer jus ao recebimento do adicional de insalubridade.
Fazendo-se um paralelo com as atividades consideradas (prejudiciais à saúde ou a integridade física) para fins de aposentadoria especial, verifica-se que o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que o rol das referidas atividades previstas nos Decretos que regulam a matéria é meramente exemplificativo, sendo possível que outras atividades não enquadradas sejam consideradas insalubres, perigosas ou penosas, nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECONHECIMENTO PELO TRIBUNAL A QUO DO EXERCÍCIO DO LABOR EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVA PARA A ALTERAÇÃO DESSA CONCLUSÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL DA UNIÃO DESPROVIDO.
1.Em observância ao princípio do tempus regit actum, deve ser aplicada no presente caso a legislação anterior à Lei 9.032/95, vigente no momento da prestação do serviço, que não elenca as atividades exercidas pelo segurado na lista de categorias expedida pelo Poder Executivo que gozam de presunção absoluta de exposição aos agentes nocivos.
2.A comprovação da insalubridade da atividade laboral encontrava-se disciplinada pelos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, que elencavam as categorias profissionais sujeitas a condições nocivas de trabalho por presunção legal, fazendo jus à contagem majorada do tempo de serviço.
3.A jurisprudência desta Corte já pacificou o entendimento de que o rol de atividades previsto nos citados Decretos é exemplificativo, sendo possível que outras atividades não enquadradas sejam comprovadamente reconhecidas como insalubres, perigosas ou penosas.
4.O Tribunal a quo, com base na análise do acervo fático-probatório produzido nos autos, reconheceu a condição de insalubridade da atividade laboral exercida pelo segurado. A alteração dessa conclusão, na forma pretendida, demandaria necessariamente a incursão das provas dos autos, o que, contudo, encontra óbice no enunciado da Súmula 7 do STJ, segundo a qual a pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial.
5.Agravo Regimental desprovido.(AgRg no AREsp 5.904/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/4/2014, DJe 5/5/2014)
Note-se, portanto, que a interpretação conferida pelo STJ se amolda melhor ao intuito protetivo da norma e, com a devida vênia a Justiça Laboral, é a interpretação correta a ser seguida em casos em que o trabalhador pleiteia o adicional de insalubridade e comprove, por meio de laudo pericial, que se encontra efetivamente submetido a agentes insalubres, ainda que o agente em questão não esteja expressamente previsto na legislação regente.
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1 – Protecionismo. É atitude preservadora do equilíbrio contratual, diante da evidência de ser o trabalho humano produtivo um valor social ser protegido e de ser o trabalhado um sujeito ordinariamente vulnerado nas relações de emprego. Trata-se, portanto, de uma conduta tuitiva, que garante: i) a aplicação de normas mais favoráveis aos trabalhadores quando existentes duas ou mais e vigência simultânea; ii) a manutenção de condições contratuais mais benéficas; iii) e a interpretação favorável ao trabalhador, quando presente dúvida. (Martinez, Luciano, Curso de Direito do Trabalho: relações individuais, sindicais e coletivas do trabalho, 3ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2012, p.46)