O Auxílio-funeral e o valor mínimo previsto na legislação Previdenciária.

Por Odasir Piacini Neto

Em recente decisão, publicada em 10/05/2012, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), condenou a empresa MRS Logística S/A a pagar as despesas com funeral e sepultura de um homem que foi atropelado por um trem pertencente à empresa, estabelecendo que, desde que limitada ao mínimo previsto na legislação previdenciária, não se exigiria a comprovação das despesas. A decisão restou assim ementada:

CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DESPESAS DE FUNERAL E SEPULTAMENTO. PROVA. DESNECESSIDADE, DESDE QUE LIMITADA AO PISO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA.

1. Desde que limitada ao mínimo previsto na legislação previdenciária, não se exige, para fins de indenização, a comprovação das despesas havidas com funeral e sepultamento, por se tratar de fato notório que deve ser presumido, pela insignificância do valor no contexto da ação, bem como pela natureza social da verba, de proteção e respeito à dignidade da pessoa humana.

Precedentes.

2. A aparente divergência jurisprudencial no âmbito do STJ, pela necessidade de comprovação das despesas de funeral, é antiga e se encontra superada.

3. Recurso especial provido.

(REsp 1128637/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/05/2012, DJe 10/05/2012)

No entanto, a aludida decisão não estabeleceu quanto seria o referido “mínimo estabelecido na legislação previdenciária”, o que se justifica tendo em vista a atual lacuna existente na legislação no tocante à matéria.

O auxílio-funeral era regulamentado pela Previdência Social nos termos do artigo 141 da Lei n° 8.213 de 1991. Entretanto, com o advento da Lei n° 8.742, de 7 de dezembro de 1993 – Lei Orgânica de Assistência Social, houve a extinção do auxílio-funeral no âmbito da Previdência Social, transpondo-se o auxílio-funeral para o seio da Assistência Social, sendo, então, criados os denominados benefícios eventuais, nos termos do artigo 40[1] do aludido diploma legal.


[1] Art. 40. Com a implantação dos benefícios previstos nos arts. 20 e 22 desta lei, extinguem-se a renda mensal vitalícia, o auxílio-natalidade e o auxílio-funeral existentes no âmbito da Previdência Social, conforme o disposto na Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.

O Decreto n° 1744 de 8 de dezembro de 1995, o qual regulamentava o benefício de prestação continuada (LOAS), extinguiu de vez o auxílio-funeral, por meio do seu artigo 39, sendo estabelecido como termo final do benefício o dia 01 de janeiro de 1996. Por fim, a Lei n° 9.528 de 10 de dezembro de 1997 revogou o artigo 141 da Lei n° 8.213/91, extirpando do ordenamento o último resquício do auxílio funeral.

Restaram, portanto, apenas os benefícios eventuais, que nos termos do artigo 22 da Lei n° 8.742/1993, constituíram provisões suplementares concedidas aos cidadãos e às famílias em virtude de eventos como nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública. Ainda, no § 1o do referido artigo, foi estabelecido que a concessão e o valor dos benefícios eventuais seriam definidos pelos Conselhos de Assistência Social dos Estados, Distrito Federal e Municípios, in verbis:

Art. 22.  Entendem-se por benefícios eventuais as provisões suplementares e provisórias que integram organicamente as garantias do Suas e são prestadas aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública.

§ 1o A concessão e o valor dos benefícios de que trata este artigo serão definidos pelos Estados, Distrito Federal e Municípios e previstos nas respectivas leis orçamentárias anuais, com base em critérios e prazos definidos pelos respectivos Conselhos de Assistência Social.

Dessa forma, ficou a cargo dos Conselhos de Assistência Social regionais estabelecer a forma de concessão, bem como o valor do benefício eventual decorrente do evento morte.

Ocorre que, na grande maioria dos entes competentes, essa regulamentação nunca existiu. Dessa forma, visando estabelecer parâmetros mínimos para concessão do benefício eventual, buscando dar efetividade ao artigo 22 da Lei n° 8.742/93, em 19 de outubro de 2006, o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) editou a Resolução n° 212, bem como, em 14 de dezembro de 2007, o Presidente da República editou o Decreto n° 6.307/2007.

Assim sendo, ficou estabelecido, no artigo 9°[1] da Resolução n° 212 do CNAS, que o benefício funeral poderia ser pago na forma de pecúnia ou na prestação de


[1] Art. 9º O benefício funeral pode ocorrer na forma de pecúnia ou na prestação de serviços.

§ 1º Os serviços devem cobrir o custeio de despesas de urna funerária, velório e sepultamento, incluindo transporte funerário, utilização de capela, isenção de taxas e colocação de placa de identificação, dentre outros serviços inerentes que garantam a dignidade e o respeito à família beneficiária.

§ 2º Quando o benefício for assegurado em pecúnia, deve ter como referência o custo dos serviços previstos no parágrafo anterior.

serviços, devendo os serviços cobrirem o custeio de despesas com urna funerária, velório e sepultamento, incluindo transporte funerário, utilização de capela, isenção de taxas e colocação de placa de identificação, dentre outros serviços inerentes que garantam a dignidade e o respeito à família beneficiária, sendo que quando pago em pecúnia o benefício deve ter como referência o custo dos referidos serviços.

Por sua vez, o artigo 4°[1] do Decreto n° 6.307/2007 estabeleceu que o auxílio por morte atenderá, prioritariamente, a despesas de urna funerária, velório e sepultamento; a necessidades urgentes da família para enfrentar riscos e vulnerabilidades advindas da morte de um de seus provedores ou membros, podendo constituir ressarcimento das referidas despesas em caso de ausência do benefício eventual no momento em que esse se fez necessário.

No entanto, os dois citados diplomas não estabeleceram um “quantum”, um valor exato como parâmetro mínimo para concessão do benefício em espécie, tendo em vista ser dos estados, Distrito Federal e municípios a competência para regulamentar o tema em questão.

Destarte, conclui-se que para dar efetividade a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça é necessário que exista no ente federativo no qual o benefício for concedido regulamentação referente à matéria. Como alternativa, em caso de inexistência de regulamentação, pode-se tomar como base os serviços estabelecidos no artigo 9° da resolução n° 212 do CNAS ou no artigo 4° do Decreto n° 6.307/2007, no intuito de não deixar o jurisdicionado desamparado em razão da mora legislativa.

Autor: Odasir Piacini Neto.


§ 1º Os serviços devem cobrir o custeio de despesas de urna funerária, velório e sepultamento, incluindo transporte funerário, utilização de capela, isenção de taxas e colocação de placa de identificação, dentre outros serviços inerentes que garantam a dignidade e o respeito à família beneficiária.

§ 2º Quando o benefício for assegurado em pecúnia, deve ter como referência o custo dos serviços previstos no parágrafo anterior.

[1]Art. 4o O auxílio por morte atenderá, prioritariamente:

I – a despesas de urna funerária, velório e sepultamento;

II – a necessidades urgentes da família para enfrentar riscos e vulnerabilidades advindas da morte de um de seus provedores ou membros; e

III – a ressarcimento, no caso da ausência do benefício eventual no momento em que este se fez necessário.

 

Advogado inscrito na OAB/DF sob nº 35.273. Graduado pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), em 2011. Mestrando em Direito pelo Centro de Ensino Unificado do Distrito Federal (UDF), autor do livro: Prescrição e Decadência dos Benefícios Previdenciários – Coleção Prática Previdenciária – Editora Juspodivm (2015) – Especialista em Direito Previdenciário (LFG – 2012). Áreas de atuação: de Direito Previdenciário e Administrativo.