Lei deixa gabinetes de tribunais temporariamente vazios

Pelo menos 38 gabinetes dos Tribunais Regionais Federais ficarão temporariamente sem desembargadores este ano. No TRF da 3ª Região, 25 dos 43 gabinetes ficarão vagos por, no mínimo, 29 dias, sendo que a ausência pode durar mais de 60 dias em alguns. Levando-se em conta que o tribunal tem 475,7 mil processos em tramitação, isso implica, teoricamente, cerca de 11 mil processos parados por pelo menos cerca de um mês.

No TRF da 4ª Região, 12 dos 27 gabinetes passarão pelo mesmo problema, assim como quatro dos 15 gabinetes de desembargadores e juízes convocados do TRF da 5ª Região. O TRF-1 e o TRF-2 não responderam às consultas feitas pela Consultor Jurídico. Os gabinetes ficarão vazios durante as férias dos magistrados que os comandam, que não podem convocar substitutos por força de lei.

Os números dos tribunais regionais federais são uma amostra do que se repete em todas as cortes de segundo grau no país. A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) prevê, em seu artigo 118, que apenas em caso de “afastamento, por prazo superior a 30 dias” de membro dos tribunais regionais é que se pode convocar juízes para substituí-los. Isso significa, na prática, que só é possível manter o gabinete funcionando se a ausência ultrapassar o período de férias — o que obriga os magistrados a emendar períodos de licença médica e compensação de dias trabalhados a mais.

Já a Resolução 51, de 2009, do Conselho Nacional de Justiça, diz que a convocação de substitutos pode ser feita quando os magistrados se afastam por um mês, ao definir que pode haver a substituição em ausências de “período igual ou superior” a 30 dias.

Parada obrigatória
Por falta de quem assine despachos ou sentenças, a ausência dos titulares dos gabinetes durante as férias faz com que milhares de processos fiquem sem julgamento e aumentam o estoque de processos acumulados. O problema aumenta quando se leva em conta os dois meses de férias a que os magistrados têm direito — embora muitos argumentem que usam o “segundo mês” para julgar e diminuir o acervo.

Para o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), desembargadorHenrique Nelson Calandra, os tribunais não podem fazer uma leitura da Loman sem levar em conta a Constituição, que é “uma lei maior”, que preza pela duração razoável do processo. Tais preceitos não são mantidos com tantas e tão prolongadas ausências, segundo Calandra.

“A substituição do magistrado afastado deve ser regra no tribunal, sempre que sua ausência se prolongue”, diz Calandra, para quem um período de dez dias ausente do tribunal já deve ser considerado longo demais para manter um gabinete sem substituto.

“A lei orgânica não pode ser em descompasso com a Constituição, que obriga a celeridade e a transparência enquanto proíbe que se deixe o jurisdicionado sem Justiça.”

Insegurança jurídica
A convocação de juízes para a “cobertura” das férias, porém, traz problemas jurisdicionais, na visão do presidente da Associação Nacional dos Juízes Federais (Ajufe), desembargador Nino Oliveira Toldo.

Ele diz que a presença de juízes convocados altera a jurisprudência dos tribunais, que deveriam ser formadas apenas pelo entendimento de seus membros titulares.

Toldo lembra ainda que férias tiradas por desembargadores em momentos distintos do ano fazem com que o quórum dos colegiados fique prejudicado. “Já vi turmas julgando com três juízes convocados e um desembargador”, reclama. O desembargador afirma que a convocação de juízes federais também desfalca a primeira instância.

Para ele, a solução seria que as férias dos magistrados voltassem a ser coletivas, mantendo as cortes fechadas por 60 dias, com julgamentos urgentes feitos por plantão. “O fim das férias coletivas foi um erro. É preciso que se aprove a Proposta de Emenda à Constituição 3/2007, que determina seu retorno”, recomenda.

Férias coletivas
A PEC 3/2007, que está em tramitação na Câmara dos Deputados, pretende alterar o artigo 93 da Constituição, passando a prever que “a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo permitidas férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, funcionando obrigatoriamente, nesses períodos, plantão a ser organizado e implementado pelos órgãos administrativos dos tribunais”.

A mudança no esquema de férias foi feita pela Emenda Constitucional 45, de 2004, que, nesse ponto, teve apoio da Ordem dos Advogados do Brasil. Hoje, porém, o presidente do Conselho Federal da OAB, Ophir Cavalcante, afirma que a alteração foi uma alternativa ruim. “O que parecia bom no campo das ideias, na prática, gera mais insegurança jurídica e distorção nos julgamentos”, reconhece. “Juízes convocados não têm tempo de conhecer processos nem a jurisprudência das turmas.”

Segundo ele, a Ordem passou a rever sua posição a respeito. Hoje, ainda não há consenso, mas a tendência é que a entidade passe a apoiar a PEC 3/2007.

 

Nascido em Brasília em 10 de julho de 1971, formou-se em Direito no Uniceub em 1993. É pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e Processo Civil. Conselheiro Seccional eleito por duas gestões 2004/2009, tendo presidido a Comissão de defesa e prerrogativas da OAB/DF. Vice-presidente da OAB/DF no período de 2008/2009. Ocupou o cargo de Secretário-Geral da Comissão Nacional de Prerrogativas do Conselho Federal da OAB na gestão 2007/2010. Eleito Presidente da OAB/DF para o triênio 2013/2015, tendo recebido a maior votação da classe dos advogados no Distrito Federal com 7225 votos. É diretor do Conselho Federal da OAB na gestão 2016/2019, corregedor-geral da OAB e conselheiro federal pela OAB/DF.