Impressões sobre nova lei de lavagem de dinheiro

Em 10 de julho deste ano foi publicada a Lei 12.683/2012, a Nova Lei de Lavagem de Dinheiro, entrando em vigor imediatamente. O novo diploma altera a Lei 9.613/1998, a fim de tornar mais eficiente a persecução penal dos crimes de lavagem de dinheiro. A intenção da nova norma é de máxima importância, porém o trabalho legislativo ensejou duras críticas, sobretudo por parte dos advogados, que viram o direito ao sigilo da profissão na iminência de ser fortemente abalado, como se demonstrará a seguir.

Entre algumas mudanças provocadas na antiga Lei 9613/98, o novo diploma considera que o dinheiro, produto de qualquer crime, que tenha sido “lavado”, ou seja, que tenha a sua origem ilícita dissimulada, vindo a ter aparência de licitude, cumpre o requisito de configuração do crime de lavagem de dinheiro. A Nova Lei amplia também o rol de pessoas físicas e jurídicas obrigadas a informar movimentações financeiras atípicas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Dentre as mudanças trazidas pela Lei 12.683/2012, ainda, chama-nos atenção o artigo 9º, XIV, segundo o qual as pessoas físicas ou jurídicas que prestem, mesmo que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza, em operações: (…)”. Tal dispositivo perturbou a ordem da comunidade jurídica, que se deparou com a possibilidade de ter que delatar seus clientes, que lhes confiam informações sigilosas, ao divulgar dados ao Coaf.

Diante dessa situação, o Órgão Especial do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, frente a uma consulta apresentada pelo presidente nacional da OAB, analisou no último dia 21 de agosto os impactos da nova Lei de Lavagem de Dinheiro, elaborando um relatório que define que os “profissionais da advocacia não devem abrir dados sigilosos de seus clientes em investigações sobre lavagem de dinheiro”.

A conselheira Daniela Teixeira, relatora do mencionado relatório, defende que os advogados e as sociedades de advogados não devem ingressar no rol de entidades que devem informar suas operações com seus clientes ao Coaf, uma vez que tal feito iria de encontro com a garantia do sigilo prevista pelo Estatuto da Advocacia, Lei 8.906/1994. Segundo a relatora, a lei é louvável, contudo o advogado tem o dever de guardar sigilo dos dados fornecidos pelos clientes, não devendo ter a obrigação de delata-lo.

Defende-se, igualmente, que a interpretação da lei deve trazer ressalvas considerando o sigilo da atividade do advogado, nos termos do Estatuto da Advocacia, da OAB e da Constituição Federal, onde é resguardada a inviolabilidade do exercício da advocacia, bem como a ampla defesa do jurisdicionado. Pelos princípios de hermenêutica, a lei genérica só revoga os princípios da lei específica se o fizer explicitamente, e nesse sentido prevalecem os princípios que já consagrados que defendem o sigilo no exercício da advocacia.

Frente a essa situação, a Confederação Nacional dos Profissionais Liberais (CNLP) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade 4841 no Supremo Tribunal Federal contra as novas regras da Nova Lei de Lavagem de Dinheiro, impostas aos profissionais liberais. Para a entidade, a norma fere o princípio constitucional da proporcionalidade, ignorando o direito-dever dos profissionais liberais de exercerem a profissão mantendo sigilo.

A CNLP acredita que as novas regras extrapolam os limites da razoabilidade, rompendo o sigilo profissional, tão caro às profissões liberais. Defendem, ainda, que o Brasil adota um microssistema normativo de proteção do profissional liberal e de seu cliente, visando impedir que os dados confidenciados a esses profissionais sejam revelados, a quem quer que seja. Tal microssistema é, sem duvida, um mecanismo de manutenção da democracia e das liberdades públicas e pessoais que contribuem para estrutura do nosso Estado de Direito, não devendo e nem podendo ser ignorados.

Em pedido a CNLP solicita a concessão de liminar para suspender os dispositivos questionados, considerando que os danos causados pela quebra de sigilo podem ser irreversíveis. No mérito, pede a inconstitucionalidade de tais dispositivos. O relator da ADIN é o ministro Celso de Mello.

A situação não parece deixar dúvidas de que o exercício da advocacia resta comprometido. Não questionamos que o controle da lavagem de capitais é uma atividade de suma importância, no entanto não vemos necessidade de transformar o advogado de defensor a delator de seu próprio cliente. A relação de confiança que perdura desde o início da profissão, bem como os demais princípios que garantem o pleno exercício da advocacia, devem ser preservados.

 

Nascido em Brasília em 10 de julho de 1971, formou-se em Direito no Uniceub em 1993. É pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e Processo Civil. Conselheiro Seccional eleito por duas gestões 2004/2009, tendo presidido a Comissão de defesa e prerrogativas da OAB/DF. Vice-presidente da OAB/DF no período de 2008/2009. Ocupou o cargo de Secretário-Geral da Comissão Nacional de Prerrogativas do Conselho Federal da OAB na gestão 2007/2010. Eleito Presidente da OAB/DF para o triênio 2013/2015, tendo recebido a maior votação da classe dos advogados no Distrito Federal com 7225 votos. É diretor do Conselho Federal da OAB na gestão 2016/2019, corregedor-geral da OAB e conselheiro federal pela OAB/DF.