Análise da PEC 287/16 – Parte 1

Por Odasir Piacini Neto

O presente artigo será o primeiro de uma série que visará fazer uma análise, sem nenhuma pretensão de esgotar o tema debatido, acerca das principais mudanças previstas no texto da PEC 287/16, em especial no tocante aos servidores públicos civis.

A primeira mudança encontra-se prevista no §13º do artigo 37 que se pretende acrescer ao texto da Lei Maior, o qual traz para o âmbito constitucional o instituto da readaptação, vejamos:

Art. 37 (…)

  • 13. O servidor titular de cargo efetivo poderá ser readaptado para exercício de cargo cujas atribuições e responsabilidades sejam compatíveis com a limitação que tenha sofrido em sua capacidade física ou mental, mediante perícia em saúde, enquanto permanecer nesta condição, desde que a habilitação e o nível de escolaridade exigidos para o cargo de destino sejam iguais ou inferiores aos de origem, mantida a remuneração do cargo de origem.

O instituto da readaptação já possuía expressa previsão no âmbito infraconstitucional, como, por exemplo, o Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da União, lei 8.112/90, a qual em seu artigo 24 assim estabelece:

Art. 24. Readaptação é a investidura do servidor em cargo de atribuições e responsabilidades compatíveis com a limitação que tenha sofrido em sua capacidade física ou mental verificada em inspeção médica.

1o Se julgado incapaz para o serviço público, o readaptando será aposentado.

  • 2o A readaptação será efetivada em cargo de atribuições afins, respeitada a habilitação exigida, nível de escolaridade e equivalência de vencimentos e, na hipótese de inexistência de cargo vago, o servidor exercerá suas atribuições como excedente, até a ocorrência de vaga

Quanto a esse dispositivo, verifica-se que a proposta não traz nenhuma novidade relevante para os servidores públicos.

Prosseguindo a análise das alterações, chegamos a primeira mudança substancial, conforme estabelece a proposta de nova redação para o artigo 40, §1º, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 40……………………………………………………………………..
§ 1º Os servidores abrangidos pelo regime de previdência de que trata este artigo serão aposentados:
I – voluntariamente, observados, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta e dois anos de idade, se mulher;

Da leitura do citado dispositivo verifica-se que a idade mínima para aposentação foi majorada em cinco anos para os homens e sete anos para as mulheres, uma vez que a redação atual da CF exige como idade mínima para que o servidor possa se aposentar: sessenta anos para o homem e cinquenta e cinco anos para mulher¹.

Quanto ao requisito tempo de contribuição, a Proposta em análise pretende que o texto da Constituição passe a vigorar com a seguinte redação, litteris:

  1. b) vinte e cinco anos de contribuição, desde que cumprido o tempo mínimo de dez anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que for concedida a aposentadoria;

Note-se, portanto, que no tocante ao tempo de contribuição, ao contrário da idade, houve uma redução na exigência mínima. Isso porque, de acordo com a regra vigente, exige-se do servidor homem trinta e cinco anos de contribuição, o que, por sua vez, corresponde a uma redução de dez anos, e da servidora mulher trinta anos de contribuição, o que, por sua vez, corresponde a uma redução de cinco anos.

Por sua vez, os requisitos tempo mínimo de serviço público e tempo de serviço no cargo efetivo em que será a aposentadoria permanecem inalterados.

Nesse ponto, nos parece ser passível de crítica a proposta debatida, uma vez que, apesar de ter aumentando em cinco anos a idade mínima para o servidor homem e em sete anos para a servidora mulher, reduziu, em dez anos a contribuição para o servidor homem e cinco anos para a servidora mulher, o que, por sua vez, não nos parece compatível com a principal justificativa para propositura da reforma: o tão propalado déficit da previdência².

Explicamos, um servidor público homem que, por ventura, venha a ingressar no serviço público de forma tardia, aos quarenta anos de idade e verta contribuições durante vinte e cinco anos para o regime próprio ao qual estiver vinculado, terá todos os requisitos para aposentação preenchidos, ainda que tenha contribuído com dez anos de contribuição a menos do que a regra atual.

Ou seja, o servidor contribuirá durante um período menor, ainda que se aposente com a exigência de idade um pouco maior, e, em regra, gozará de um benefício durante um período maior, isso levando-se em consideração o constante aumento na expectativa de vida dos brasileiros, fato que, aliado às baixas taxas de natalidade, tem gerado a também tão discutida inversão da pirâmide etária³.

Assim, em uma primeira análise, a regra em questão não nos parece adequada com o fim pretendido.

Prosseguindo na análise, a proposta traz as modalidades de aposentadoria por invalidez e por tempo de contribuição, vejamos:

II – por incapacidade permanente para o trabalho, no cargo em que estiver investido, quando insuscetível de readaptação, sendo obrigatória a realização de avaliações periódicas para verificação da continuidade das condições que ensejaram a concessão da aposentadoria; ou

III – compulsoriamente, aos setenta e cinco anos de idade.

No tocante a aposentadoria por invalidez, a proposta pretende incluir no texto da Constituição previsão já constante na legislação infraconstitucional4, qual seja: a necessidade de avaliações periódicas do servidor para verificação da continuidade das condições que ensejaram a concessão da aposentadoria a qual, caso ocorra a provação da Emenda, deixará de ser uma faculdade da administração, para se tornar uma obrigação.

A exigência em questão é prudente e interessante, na medida em que visa evitar que um servidor apto para o desempenho de suas atribuições, em decorrência da cessação da moléstia que levou à aposentação, fique gozando de um benefício ao qual não faz jus, ao invés de colaborar com a Administração Pública com sua força de trabalho.

Quanto a aposentadoria compulsória, fica unificada a idade de setenta e cinco anos.

Feita uma breve análise no tocante aos requisitos, passamos a analisar as regras que dizem respeito a forma de cálculo dos benefícios, vejamos:

  • 2º Os proventos de aposentadoria não poderão ser inferiores ao valor referido no § 2º do art. 201 ou superiores ao limite máximo estabelecido para o regime geral de previdência social.
  • 2º-A Os proventos das aposentadorias decorrentes do disposto neste artigo terão como referência a média aritmética simples das remunerações e dos salários de contribuição, selecionados na forma da lei, utilizados como base para contribuições ao regime de previdência de que trata este artigo e ao regime geral de previdência social.

Os citados dispositivos interpretados em conjunto trazem as seguintes possibilidades: não haverá nenhum benefício de aposentadoria inferior a um salário mínimo ou superior ao teto do regime geral de previdência social5, de modo que o cálculo desse valor deve ser feito mediante uma média aritmética simples das remunerações e dos salários de contribuição.

Ocorre que, diferentemente do que ocorre atualmente, por exemplo, no âmbito da União6, o valor dos proventos de aposentadoria não corresponderá a 100% (cem por cento) do valor dessa média, devendo ser observada a regra descrita na redação da proposta de §3º que assim dispõe:

  • 3º Os proventos da aposentadoria, por ocasião da sua concessão, corresponderão:

I – nas hipóteses do inciso I do § 1º, do inciso II do § 4º, do § 4º-A e do § 5º, a 70% (setenta por cento) da média referida no § 2º-A, observando-se, para as contribuições que excederem o tempo de contribuição mínimo exigido para concessão do benefício, os seguintes acréscimos, até o limite de 100% (cem por cento), incidentes sobre a mesma média:

  1. a) do primeiro ao quinto grupo de doze contribuições adicionais, 1,5 (um inteiro e cinco décimos) pontos percentuais por grupo;
    b) do sexto ao décimo grupo de doze contribuições adicionais, 2 (dois) pontos percentuais por grupo;
  2. c) a partir do décimo-primeiro grupo de doze contribuições adicionais, 2,5 (dois inteiros e cinco décimos) pontos percentuais por grupo;

Assim sendo, verifica-se que, em regra, os proventos irão corresponder a 70% (setenta por cento) do valor da média aritmética retro mencionada, podendo corresponder, no máximo, ao valor de 100% (cem por cento) dessa média, a depender dos períodos de contribuição excedentes que possuir o servidor.

Quanto aos períodos excedentes, do primeiro ao quinto ano de contribuição excedente, cada ano acrescerá 1,5 (um inteiro e cinco décimos) pontos percentuais na média dos proventos (alínea “a”), do sexto ao décimo ano de contribuição excedente, cada ano acrescerá 2 (dois) pontos percentuais (alínea “b”), a partir do décimo primeiro ano, cada ano acrescerá 2,5 (dois inteiros e cinco décimos) pontos percentuais na média dos proventos (alínea “c”).

Por exemplo, um servidor que contribuir com cinco anos de contribuição a mais do que o tempo exigido para fins de aposentação terá seus proventos de aposentadoria calculados com base em 77,5% (setenta e sete e meio por cento) da média aritmética simples das remunerações e dos salários de contribuição, o que corresponde a 70% (setenta por cento) mais 5 (cinco) grupos de doze contribuições x 1.5 (um inteiro e cinco décimos).

No tocante a aposentadoria por invalidez, aplica-se idêntica regra, excetuando-se, apenas, às hipóteses em que o servidor for aposentado por doença ocupacional ou acidente em serviço, circunstâncias em que o valor dos proventos corresponderá a 100% (cem por cento) do valor da média aritmética, nesses termos dispõe a proposta de redação do inciso II do §3º do artigo 40 da PEC:

II – na hipótese do inciso II do § 1º, a 70% (setenta por cento) da média referida no § 2º-A, aplicando-se os acréscimos de que tratam as alíneas a, b e c do inciso I deste parágrafo se superado o tempo mínimo de contribuição necessário para a aposentadoria voluntária, de que trata o inciso I do § 1º, exceto em caso de acidente em serviço e doença profissional, quando corresponderão a 100% (cem por cento) da média referida no § 2º-A;

Note-se, portanto, que, diferentemente da regra atual, as doenças graves, contagiosas ou incuráveis previstas em lei7 não mais terão forma de cálculo dos proventos diferenciada, assim como não mais serão concedidos proventos integrais para os servidores que se aposentarem por invalidez em decorrência de acidente em serviço ou doença profissional, os quais, como dito anteriormente, terão proventos equivalentes à 100% (cem por cento) da média aritmética.

Prosseguindo a análise das formas de cálculo, temos a aposentadoria especial do deficiente físico, a qual terá proventos de aposentadoria corresponde a 100% da média aritmética simples das remunerações e dos salários de contribuição, nesses termos dispõe o inciso III do §3º do artigo 40 da PEC, in verbis:

III – na hipótese do inciso I do § 4º, a 100% (cem por cento) da média referida no § 2º-A;

Cabe ressaltar que, até a presente data, inexiste, ao menos no âmbito federal, legislação específica que trate da aposentadoria especial do deficiente físico, de modo que, em grande parte dos três poderes, por força de Mandados de Injunção propostos por entidades representativas de servidores, tem sido aplicada a legislação do Regime Geral de Previdência Social, LC 142/138, a qual também estabelece proventos de aposentadoria correspondentes a 100% (cem por cento) média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição.

Assim sendo, pelo menos no tocante a forma de cálculo, a modalidade de aposentadoria em questão possuirá regramento específico para o servidor público tratado expressamente no âmbito da Constituição Federal.

Por sua vez, a forma de cálculo da aposentadoria compulsória pretendida possui a seguinte redação:

IV – na hipótese do inciso III do § 1º, ao resultado do tempo de contribuição dividido por vinte e cinco, limitado a um inteiro, multiplicado pelo resultado do cálculo previsto no inciso I deste parágrafo, ressalvado o caso de cumprimento de critérios de acesso para aposentadoria voluntária que resulte em situação mais favorável.

De redação aparentemente complexa, o citado dispositivo estabelece que o servidor que se aposentar de forma compulsória terá seus proventos calculados de forma proporcional. Por exemplo, o servidor que se aposentar compulsoriamente aos setenta e cinco anos de idade, e vinte anos de contribuição, terá seus proventos calculados da seguinte forma: 20/25 = 0,8 x 70% (setenta por cento) da média aritmética simples das remunerações e dos salários de contribuição.

Limita-se a um inteiro, pois ainda que o servidor tenha mais do que vinte e cinco anos de contribuição o fator que irá ser utilizado para multiplicar a média aritmética não poderá exceder “1”.

A forma de reajustamento dos benefícios discutidos até aqui será feita nos mesmos moldes dos reajustes concedidos aos benefícios do regime geral de previdência, nesse sentido:

  • 8º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, nos termos fixados para o regime geral de previdência social.

Concluímos, assim, o primeiro artigo da série que visa acerca das principais mudanças previstas no texto da PEC 287/16, no próximo artigo analisaremos as regras, requisitos e forma de cálculo, das aposentadorias especiais.

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1 Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.
(…)
III – voluntariamente, desde que cumprido tempo mínimo de dez anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria, observadas as seguintes condições:
(…)
a) sessenta anos de idade e trinta e cinco de contribuição, se homem, e cinqüenta e cinco anos de idade e trinta de contribuição, se mulher;

2 Artigo de minha autoria publicado em 25 de maio de 2012: A previdência Social e seu falacioso Déficit.

3 Portal do Envelhecimento

4 Lei 8.112/1990: Art. 188. A aposentadoria voluntária ou por invalidez vigorará a partir da data da publicação do respectivo ato.
(…)
§ 5o A critério da Administração, o servidor em licença para tratamento de saúde ou aposentado por invalidez poderá ser convocado a qualquer momento, para avaliação das condições que ensejaram o afastamento ou a aposentadoria.

5 BENEFÍCIOS: Índice de reajuste para segurados que recebem acima do mínimo é de 6,58% em 2017

6 Lei 10.887/04: Art. 1o No cálculo dos proventos de aposentadoria dos servidores titulares de cargo efetivo de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, previsto no § 3o do art. 40 da Constituição Federal e no art. 2o da Emenda Constitucional no 41, de 19 de dezembro de 2003, será considerada a média aritmética simples das maiores remunerações, utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência a que esteve vinculado, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde a do início da contribuição, se posterior àquela competência.

7 Constituição Federal de 1988 redação atual: Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.
(…)
§ 1º Os servidores abrangidos pelo regime de previdência de que trata este artigo serão aposentados, calculados os seus proventos a partir dos valores fixados na forma dos §§ 3º e 17: (Redação dada pela EC 41, 19.12.03)

I – por invalidez permanente, sendo os proventos proporcionais ao tempo de contribuição, exceto se decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, na forma da lei;

8 LC 142/13: Art. 8o A renda mensal da aposentadoria devida ao segurado com deficiência será calculada aplicando-se sobre o salário de benefício, apurado em conformidade com o disposto no art. 29 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, os seguintes percentuais:
I – 100% (cem por cento), no caso da aposentadoria de que tratam os incisos I, II e III do art. 3o; ou

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Advogado inscrito na OAB/DF sob nº 35.273. Graduado pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), em 2011. Mestrando em Direito pelo Centro de Ensino Unificado do Distrito Federal (UDF), autor do livro: Prescrição e Decadência dos Benefícios Previdenciários – Coleção Prática Previdenciária – Editora Juspodivm (2015) – Especialista em Direito Previdenciário (LFG – 2012). Áreas de atuação: de Direito Previdenciário e Administrativo.