Ação de prestação de contas por titular de conta-corrente não se destina à revisão de cláusulas contratuais

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não acolheu o pedido de um consumidor que, inconformado com o saldo da sua conta-corrente, ajuizou ação de prestação de contas com o objetivo de obter a discriminação da movimentação financeira para verificar a legalidade dos encargos cobrados.

Para a maioria dos ministros do colegiado, embora cabível a ação de prestação de contas pelo titular da conta-corrente (Súmula 259), independentemente do fornecimento extrajudicial de extratos detalhados, tal instrumento processual não se destina à revisão de cláusulas contratuais.

Além disso, a Turma entendeu que a petição inicial não prescinde da indicação de período determinado em relação ao qual o correntista busca esclarecimentos, com a exposição de motivos consistentes – ocorrências duvidosas na conta-corrente, que justifiquem a provocação do Poder Judiciário mediante ação de prestação de contas.

O pedido

O consumidor ajuizou a ação contra o HSBC Bank Brasil S/A, com o objetivo de obter a movimentação financeira da sua conta-corrente, com discriminação de “todas as taxas, tarifas, multas, percentuais, modo de aplicação dos juros, existência de cumulação de encargos moratórios e remuneratórios com comissão de permanência, tributos que incidiram sobre cada uma das operações durante toda a vigência da conta, especialmente no que diz respeito aos encargos de utilização, e demais movimentações, demonstrando-as não somente em valores como contabilizando-as e também motivando-as”.

O juízo de direito da 7ª Vara Cível de Curitiba condenou o banco a prestar contas em formato mercantil, no prazo de cinco dias. Em apelação, o Tribunal de Justiça estadual entendeu pela ausência de indícios de lançamentos duvidosos e extinguiu o processo sem exame do mérito.

Interesse processual

No recurso especial, o consumidor alegou que não está obrigado a discriminar na petição inicial os lançamentos que julga irregulares e que a ação postula unicamente a correta aplicação das cláusulas pactuadas, propósito compatível com a primeira fase da ação de prestação de contas. Em função disso, sustentou que possui interesse processual na demonstração da efetiva aplicação das cláusulas contratuais na consolidação dos encargos que suportou.

Em decisão individual, o relator, ministro Luis Felipe Salomão, restabeleceu a sentença, afirmando que o dever de a instituição financeira prestar contas ao correntista está consolidado no STJ pela Súmula 259. “A jurisprudência do STJ orienta-se no sentido de que não é possível exigir do cliente do banco que detalhe, de forma rigorosa, os pontos duvidosos surgidos durante a relação jurídica mantida”, afirmou o ministro.

Súmula 259

Inconformado, o HSBC recorreu à Quarta Turma com agravo regimental em que sustentou que a matéria não é pacífica no STJ e que não há interesse de agir por falta de impugnação específica dos lançamentos reputados indevidos.

O ministro Salomão manteve sua decisão monocrática no recurso especial. A ministra Isabel Gallotti pediu vista do processo para melhor análise.

Ao votar, a ministra ressaltou que o consumidor não especifica, na petição inicial, nenhum exemplo concreto de lançamento de origem desconhecida, designado por abreviatura não compreensível ou impugnado por qualquer motivo legal ou contratual. Segundo ela, a inicial genérica poderia servir para qualquer contrato bancário, bastando a mudança do nome das partes e do número da conta-corrente.

Precedentes

A ministra Gallotti analisou, ainda, os precedentes que levaram à edição da Súmula 259 e a extensão do entendimento nela compendiado, à luz da realidade atual. “A Súmula 259 pacificou a divergência de entendimento a propósito do cabimento, ou não, de ação de prestação de contas quando o banco já as apresenta extrajudicialmente, mediante o envio de extratos claros, suficientes à compreensão de todos os lançamentos efetuados, mas o consumidor não concorda com os lançamentos apresentados”.

“Não se cogita, nos primeiros precedentes da súmula, de iniciais vagas, genéricas, sem especificação dos lançamentos duvidosos ou sequer do período em que ocorreram os débitos acerca dos quais se busca esclarecimento”, acrescentou a ministra.

Isabel Gallotti lembrou que a jurisprudência de ambas as Turmas que compõem a Segunda Seção do STJ reconhece a impossibilidade de revisão de cláusulas contratuais em ação de prestação de contas, em razão da diversidade de ritos.

“A pretensão deduzida na inicial, voltada a aferir a legalidade dos encargos cobrados, deveria ter sido veiculada, portanto, por meio de ação ordinária revisional, cumulada com repetição de eventual indébito, no curso da qual, se insuficientes os extratos, pode ser requerida a exibição de documentos, caso esta não tenha sido postulada em medida cautelar preparatória”, concluiu Gallotti.

Os ministros Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com a ministra, que lavrará o acórdão.

Nascido em Brasília em 10 de julho de 1971, formou-se em Direito no Uniceub em 1993. É pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e Processo Civil. Conselheiro Seccional eleito por duas gestões 2004/2009, tendo presidido a Comissão de defesa e prerrogativas da OAB/DF. Vice-presidente da OAB/DF no período de 2008/2009. Ocupou o cargo de Secretário-Geral da Comissão Nacional de Prerrogativas do Conselho Federal da OAB na gestão 2007/2010. Eleito Presidente da OAB/DF para o triênio 2013/2015, tendo recebido a maior votação da classe dos advogados no Distrito Federal com 7225 votos. É diretor do Conselho Federal da OAB na gestão 2016/2019, corregedor-geral da OAB e conselheiro federal pela OAB/DF.