Código de Trânsito é, ao mesmo tempo, severo e leniente

A nossa legislação de trânsito, o Diploma 9.503, de 23 de setembro de 1997, denominado Código de Trânsito Brasileiro, inovou e aperfeiçoou o mecanismo de dirigibilidade e segurança, porém, depois de quase 15 anos de sua vigência, e a par de algumas poucas mudanças havidas, é tempo de mudanças.

Metade da frota hoje em circulação veio a ser inserida na última década e isso se comprova pelos congestionamentos e o caos diário das grandes e médias cidades.

O mais grave temos uma estatística pecaminosa e cruel de mortes no trânsito, o que somente demonstra que não basta a lei, é preciso punir, educar e orientar antes de tudo, sem uma política pública de trânsito eficiente e participativa, acontecerão barbaridades e muitas pessoas inocentes serão vítimas dos criminosos nos volantes.

Marca época a decisão do Supremo Tribunal Federal que considera dirigir embriagado crime, pois que o artigo 306 do Código de Trânsito tratava como se fosse delito de perigo, pena de detenção de seis meses a três anos, o que permitia concluir que ninguém ficaria preso nos moldes da legislação em vigor.

Nada obstante, o código em vigor é severo em alguns aspectos e leniente em tantos outros, principalmente com relação às autoridades de trânsito.

Observamos que o maior objetivo das prefeituras e estados, além da União, é conseguir incluir radares de todo o tipo e espécie a facilitar a arrecadação, raramente há policiamento nas comunas, estradas ou locais considerados perigosos notadamente durante à noite.

O carro passou a ser, diga-se a verdade, a maior fonte de arrecadação dos poderes públicos, desde a fabricação, com a substituição tributária de IPI e ICMS, passando pelo IPVA,  ao lado do licenciamento, inspeção veicular, seguro obrigatório, multas e outras incidências amargas para o contribuinte.

O espírito que deveria nortear o novo Código de Trânsito abriria espaço para transmitir uma cultura e mentalidade compatíveis.

O que percebemos em geral são punições administrativas amplas e o cumprimento de metas de arrecadação, porém, é uma confusão generalizada, começando pelas placas não atualizadas, passando pelas motos que cruzam todas as faixas, pelos pedestres que sequer olham os semáforos e atravessam longe das faixas de pedestres.

E se formos enxergar qualquer pessoa, basta que tenha recurso financeiro, pode comprar, sem ser habilitada, carro, moto ou veículo automotor, existem dois fatores conjugados que mostram as vicissitudes do sistema, a impunidade gritante e a falta de pulso das autoridades, somadas aos fatores de corrupção  aglutinados às facilitações obtidas.

Deveras o carro tornou-se uma presa fácil dos governos para buscarem superávit de caixa, até protestos de multa começam a fazer e colocar os nomes dos devedores no sistema de proteção ao crédito para que ele pague os valores.

O sistema é incompatível e incongruente, carros potentes e importados circulam, mas as vias e rodovias não comportam velocidade acima de 100 ou no máximo de 120 km/h e, além disso, nada se amplia em termos de dar fluxo ao número surpreendente de carros que se somam a tantos outros.

O rodízio já perdeu, há muito tempo, sua finalidade, a qualquer hora do dia e da noite, finais de semana, somos tomados pelos congestionamentos.

Demais a mais, os carros estacionam em qualquer lugar, dos dois lados da rua, embora sem espaço, e nela circulem ônibus, o que evidencia a anemia da autoridade de trânsito.

Placas de velocidade são trocadas com uma enorme rapidez, de 80 para 70, e depois 60, sem que saibamos ao certo os critérios de conveniência e oportunidade.

Um bom Código de Trânsito deve conter uma eficiente política educativa, de conscientização e de exemplar punição para aqueles que se mostram refratários da proteção à sociedade.

Não existe um estudo de compatibilidade entre as malhas e os carros que ingressam nas ruas, avenidas e estradas diariamente.

O que se busca é também o pedágio cada vez mais caro e o aumento das praças a fim de que todos se cotizem em torno do serviço que funciona em condições adversas.

Atendimento em estradas demoram, segurança nenhuma, pistas sempre sendo reformadas e congestionamentos nas marginais diários.

Há saída, existe alternativa, os mais céticos não acreditam, os mais otimistas derramam esperanças e pedem mais carros, já que o transporte público também mostra sinais de estrangulamento, não se entra mais em determinado horário em trens ou no metrô.

Estamos perto da realização de grandes eventos internacionais e a nossa malha ferroviária é praticamente inexistente, precisamos rápida e urgentemente interligar os transportes modais, com maior agilidade e eficiência.

Na Europa, qualquer aeroporto tem trens, ônibus e outros meios de circulação entre cidades, estados e até países.

Cabe ao governo gerir a política de um novo Código de Trânsito que não se ocupe ou preocupe em punir exclusivamente, mas mentalizar a população e as montadoras para os riscos incorridos, notadamente pela emissão de gás carbônico nas motos, superior aos dos carros, e, ao mesmo tempo, um debate na consecução de reunirmos ferramentas e instrumentos que permitam diminuir os transtornos do cotidiano em harmonia com o meio ambiente e transportes alternativos.

 

Nascido em Brasília em 10 de julho de 1971, formou-se em Direito no Uniceub em 1993. É pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e Processo Civil. Conselheiro Seccional eleito por duas gestões 2004/2009, tendo presidido a Comissão de defesa e prerrogativas da OAB/DF. Vice-presidente da OAB/DF no período de 2008/2009. Ocupou o cargo de Secretário-Geral da Comissão Nacional de Prerrogativas do Conselho Federal da OAB na gestão 2007/2010. Eleito Presidente da OAB/DF para o triênio 2013/2015, tendo recebido a maior votação da classe dos advogados no Distrito Federal com 7225 votos. É diretor do Conselho Federal da OAB na gestão 2016/2019, corregedor-geral da OAB e conselheiro federal pela OAB/DF.